FÁBULAS

 

   FAVOLE



Objectos inanimados viventes, animais falantes, arguciosos e sábios, mestres de vida cheios de sabedoria, que agem e pensam como homens, às vezes ávidos, tolos e grosseiros, ou conscienciosos e ajuizados, pronunciando sentenças: são as personagens das fábulas que, nascidas do povo bem antes de Esopo, fabulistas de todos os tempos e latitudes contaram, para ensinar com modo airoso a prudência e a moderação dos costumes, ou seja, as regras da comum convivência.

É difícil identificar a primeira voz narrante, porque trata-se de voz e não de escritura; esta vem mais tarde e se pode descobrir já nos antigos textos indianos, que contam fábulas de animais ou enrredadas histórias noutras histórias.
Mas os apólogos e contos sentenciosos em realidade são muito antigos e estão presentes em todas as culturas, sendo frutos da tradição oral, que constitue a passagem desde a Pré-história até ao Mito e desde o Mito até à História.
Não é por acaso que a palavra "fábula" seja baseada num verbo que significa: falar.

Quem quer que fosse Esopo, a ele se deve o mérito de haver trazido à atenção dos contemporâneos, sob a forma literária, a herança daquela tradição fabulistica (e fabulosa) remota, na qual a imaginação mistura-se com a experiência e transmite admonições e preceitos, através dos contos de animais. Mas são animais disfarçados em homens, se bem que ainda neles resta o perfil e o instinto da besta.
Ávidos da presa e movidos pelo impulso de vingança, os descreve Esopo, mas ainda conformes à natureza; só ao homem è atribuido o gosto puro do mau, feito pelo malefício.

Com Fedro, o primeiro de muitos escritores de fábulas esopianas, o animal, esvaziado da sua natureza bestial, se torna uma simples casca vazia, elevando-se ao símbolo daquilo que não se pode livremente dizer, vícios e virtudes humanas, que as fábulas mascaram debaixo de um sorriso amargo.
Da inventiva de Fedro nascem outras personagens, plantas e homens de todas as condições, que movem-se amiúde nos ambientes da Roma do seu tempo.

La Fontaine é o grande divulgador em verso do século XVII.
Não ignora Esopo, a quem considera seu mestre, nem Fedro, de quem aprecia a obra, mas atribui a si mesmo a criação da fábula poética. Ele é inovador  na expressão, ainda clássicista, mas enriquecida e ornada segundo o gosto seiscentista, e na métrica, em versos livres.
Com um estilo no qual prevalece a argúcia sobre a intenção moral, é representada, no fundo do universo, a multiforme sociedade humana. Os homens frequentemente se mascaram de animais para representar a debilidade e a força, mas também a ordem social e a pena da vida, que os oprime em vários modos, causando no poeta um sentimento de participação e piedade.
Perante esta humanidade doída, mas também engraçada e maliciosa ou mordaz, acha-se o narrador, que não se esconde, assumindo um comportamento às vezes sossegado, às vezes irônico, porém nunca completamente indiferente, pronto a denunciar, admoestar ou consolar.

As antigas fábulas de Esopo e La Fontaine são revisitadas no século XX pelo escritor brasileiro José Bento Monteiro Lobato (1882-1948), que as apresenta com conceitos e imagens próprias da cultura nacional do Brasil: onças e jabutis tomam o papel de bruxas e gnomos e os bosques si povoam com a variegada flora e fauna da terra brasílica.

No seu livro: Fábulas (1922), Monteiro Lobato constrói à roda das fábulas esópicas, uma trama narrativa original e autonoma, a qual é ao mesmo tempo um conto no conto e um comentário metastórico confiado a novas personagens por ele criadas, com uma intenção declaradamente didascálica.

Todos conhecem a fábula da Cigarra e da Formiga, tornada famosa por La Fontaine. Nessa se aparentam dois tipos humanos: um prodigo, aventado e folgazão, representado pela Cigarra; o outro avarento, previdente e egoísta, representado pela Formiga.
Por causa da evidente diversidade, a pobre Cigarra não é recebida na laboriosa e rígida sociedade das formigas, reflexo da sociedade humana dividida em ordens e castas.
Aos leitores de La Fontaine, que demonstra toda a sua simpatia pelos mais débeis, resta a amargura.

Monteiro Lobato não renuncia em ser um divulgador do seu ilustre predecessor, mas vai corregendo-lhe o tiro: como num moderno hipertexto, a fábula admite mais de um final à escolha do leitor.
No mundo das fábulas, revela Monteiro Lobato, existem uma Cigarra e duas Formigas: a formiga boa e a formiga má.
A Cigarra cumpre o seu mister. Por todo o verão chia sobre um galhinho - o único que sabe fazer - perto do formigueiro atarefado em abastecer as tulhas e quando chega a estação das chuvas, encontrando-se sem abrigo, busca agasalho das suas vizinhas.
A Formiga boa, conta Monteiro Lobato, a recebe de braços abertos, reconhecendo nela a artista que aliviou com o seu canto o duro trabalho de cada dia no formigueiro. Durante todo o mau tempo não lhe faltaría cama e mesa.

Os artistas - eis a moral da fábula - são as cigarras da humanidade, à qual toca o dever de prover às necessidades materiais deles, pois os poetas, os pintores e os músicos têm o papel particular de produzirem cultura, isto é, de serem a memória histórica duma sociedade.
Além disso, todos os trabalhos têm igual dignidade e merecem respeito, e as diversidades, de funções, étnicas e culturais, tornam a humanidade mais rica.

Voltando à fábula e ao seu segundo final.
Narra Monteiro Lobato que, na longínqua Europa, houve uma Formiga má que, não sabendo compreender a Cigarra, fechou-lhe a porta no nariz em pleno inverno e com a neve. De nada valeram as súplicas da pobrezinha, com a promessa de restituir com interesses o empréstimo de um pouco de alimento, apenas fosse possível.
A Formiga, unha de fome e invejosa das capacidades canoras da Cigarra, respondeu com arrogância, mostrando assim desdém para aquelas qualidades que haviam tornado a cigarra famosa e amada no mundo.
Repelida, a Cigarra acabou por morrer entanguidinha e a música do mundo entristecido ficou irremediavelmente vácua do seu chiado.

Então, escolha o leitor.

 



Oggetti inanimati viventi, animali parlanti, arguti e sapienti, maestri di vita stillanti saggezza, che agiscono e pensano come uomini, a volte avidi, stolti e grossolani, oppure coscienziosi e assennati, pronunciando sentenze: sono i personaggi delle favole che, nate dal popolo ben prima di Esopo, favolisti di tutti i tempi e di ogni latitudine hanno raccontato, per insegnare con garbo la prudenza e la morigeratezza dei costumi, ossia le regole della comune convivenza.

È difficile identificare la prima voce narrante, perché di voce si tratta e non di scrittura; questa viene più tardi ed è rintracciabile già negli antichi testi indiani, che riportano favole di animali o intricate storie nelle storie.
Ma apologhi e racconti sentenziosi sono in realtà antichissimi e presenti in tutte le culture, frutto della tradizione orale, che costituisce il passaggio dalla Preistoria al Mito e dal Mito alla Storia.
Non è un caso che alla base della parola "favola" vi sia un verbo che significa: parlare.

Chiunque fosse Esopo, a lui si deve il merito di aver portato all'attenzione dei contemporanei, in forma letteraria, l'eredità di quella tradizione favolistica (e favolosa) remota, in cui l'immaginazione si mescola con l'esperienza e trasmette ammonimenti e precetti, attraverso i racconti di animali. Ma sono animali camuffati da uomini, benché ancora rimanga in essi il profilo e l'istinto della bestia.
Avidi della preda e mossi da impulso vendicativo, li descrive Esopo, ma ancora conformi alla natura; solo all'uomo viene attribuito il gusto puro del male fatto per il male.

Con Fedro, il primo di molti scrittori di favole esopiane, l'animale, svuotato della sua natura bestiale e ridotto a guscio vuoto, assurge a simbolo di ciò che non si può liberamente dire, vizi e virtù umani, che le favole mascherano sotto l'agro sorriso.
Di suo l'inventiva di Fedro aggiunge altri personaggi, piante e uomini di ogni condizione, che si muovono spesso negli ambienti della Roma del suo tempo.


La Fontaine è il gran divulgatore in versi del XVII secolo.
Non ignora Esopo, che considera suo maestro, né Fedro, di cui apprezza l'opera, ma rivendica come sua la creazione della favola poetica. Egli è innovatore nell'espressione, ancora classicista, ma arricchita e infiorata secondo il gusto seicentesco, e nel metro, in versi liberi.
Con uno stile in cui prevale l'arguzia sull'intento morale, è rappresentata, nello sfondo dell'universo, la multiforme società umana. Gli uomini spesso si travestono da animali per rappresentare la debolezza e la forza, ma anche l'ordine sociale e la pena della vita, che li opprime in vari modi, generando nel poeta un sentimento di condivisione e di pietà.
Di fronte a questa umanità dolente, ma anche buffa e maliziosa o pungente, sta il narratore, che non si nasconde, ora pacato ora ironico, ma mai completamente indifferente, pronto a denunciare, ammonire o consolare.

Le antiche favole di Esopo e La Fontaine vengono rivisitate, nel Novecento, dallo scrittore brasiliano José Bento Monteiro Lobato (1882-1948), che le ripropone con concetti e immagini propri della cultura nazionale del Brasile: giaguari e testuggini svolgono il ruolo di streghe e gnomi e i boschi si popolano della variopinta flora e fauna della terra brasilica.
Nel suo libro: Favole (1922), Monteiro Lobato costruisce attorno alle favole esopiche un tessuto narrativo originale e autonomo, che è allo stesso tempo un racconto nel racconto e un commento metastorico affidato a nuovi personaggi da lui creati, con intento dichiaratamente didascalico.

Tutti conoscono la favola della Cicala e della Formica, resa famosa da La Fontaine. Vi si raffigurano due tipi umani: l'uno prodigo, sventato e gaudente, rappresentato dalla Cicala; l'altro avaro, previdente ed egoista, rappresentato dalla Formica.
A causa della sua patente diversità, la povera Cicala non viene accolta nella laboriosa e rigida società delle formiche, riflesso della umana società divisa in ordini e caste.
Ai lettori di La Fontaine, che dimostra tutta la sua simpatia per i più  deboli, resta l'amaro in bocca.

Monteiro Lobato non rinuncia ad essere il divulgatore del suo illustre predecessore, ma ne corregge il tiro: come in un moderno ipertesto, la favola ammette più di un finale; scelga il lettore.
Nel mondo delle favole, rivela Monteiro Lobato, esistono una Cicala e due Formiche: la formica buona e quella cattiva.
La Cicala fa il suo mestiere: per tutta l'estate frinisce su un ramo - non sa fare altro - vicino al formicaio indaffarato a riempire le dispense e quando viene la stagione delle piogge, non avendo riparo, cerca ospitalità dalle sue vicine.
La Formica buona, narra Monteiro Lobato, la accoglie a braccia aperte, riconoscendo in lei l'artista che ha reso più lieve con il suo canto il duro lavoro di ogni giorno nel formicaio. Finché durerà il maltempo non le mancherebbe da mangiare e da dormire.

Gli artisti - è questa la morale della favola - sono le cicale dell'umanità, alla quale spetta il compito di provvedere alle loro necessità materiali, poiché i poeti, i pittori, i musicisti hanno il ruolo speciale di produrre cultura, cioè di essere la memoria storica di una società.
Tutti i lavori, inoltre, sono di pari dignità e meritano rispetto, e le diversità, di funzioni, etnie e culture, rendono l'umanità più ricca.

Tornando alla favola e al suo secondo finale.
Narra Monteiro Lobato che, nella lontana Europa, c'era una Formica cattiva che, non sapendo comprendere la Cicala, le sbatté la porta in faccia in pieno inverno e con la neve. A nulla valsero le suppliche della meschina, le sue promesse di restituire il prestito di un po' di cibo con gli interessi, appena possibile.
La Formica, tirchia oltre ogni dire e invidiosa delle capacità canore della Cicala, rispose con arroganza, mostrando di disprezzare proprio le qualità che avevano reso la cicala famosa e amata nel mondo.

Respinta, la Cicala finì per morire assiderata e la musica del mondo intristito rimase irrimediabilmente vuota del suo frinire.

Dunque, scelga il lettore.


Mapa do Site / Mappa del Sito   Index Nações Lusófonas / Nazioni Lusofone   Monteiro Lobato / Monteiro Lobato